Descentralizar a internet... das nossas vidas

Talvez essa seja a consequência natural da colonização da internet pela iniciativa privada. Colonização essa que tem acontecido desde a década de 2010 e que vem piorando dia após dia, no processo carinhosamente batizado de enshitification ou merdificação, na minha própria tradução. Assistimos a mais um desdobramento desse processo com as IAs que rapidamente envenenaram o meio digital com o seu slop de texto, imagem e vídeo se tornando tão inescapável quanto indesejado, devorando tudo que já foi publicado na rede mundial de computadores sem se preocupar com... bem, com nada, para falar a verdade. Some-se isso ao cansaço, ou saturação, que já estavamos observando com as mídias sociais (que há muito deixaram de ser sociais) e temos um movimento, minoritário que seja, de busca por alternativas. Como sair do Twitter, como sair do Instagram, como sair do Whatsapp, como desgooglar meu celular, etc, etc.

Nos pegamos completamente dominados pela Big Tech e cada dia que passa fica mais óbvio que não é coisa boa estar nessa posição. Toda essa merdificação na verdade me lembra de chamadas telefônicas: esse meio de comunicação que foi profundamente revolucionário por sua velocidade e praticidade e que ainda existe, mas foi completamente merdificada e hoje em dia ninguém lembra da última vez que recebeu uma ligação que não fosse spam. Assim como com as chamadas telefônicas, houve um tempo antes da internet e, talvez, haverá um tempo depois (na medida do possível). Conforme nos aproximamos de tornar a Teoria da Internet Morta em uma realidade, conforme a internet se torna cada vez mais insalubre em múltiplas frentes, talvez coletivamente comecemos a buscar alternativas.

Dificilmente vamos abandonar a web completamente, mas diria que a relação com ela vai mudar. Já começou a acontecer. Estamos vendo ressurgir uma busca por curadoria digital mais consciente, menos algorítmica, um afastamento das redes sociais comerciais, em partes para evitar tudo que tem de errado com elas, em parte para recuperar um pouco de espaço mental. E cada vez mais as pessoas se tornam mais criticas da forma como os negócios são feitos na internet. software as service, violação descarada de privacidade, produtos feitos para serem viciantes e que se danem as consequências, o fato de que até o nosso hardware não ser mais tão nosso assim ultimamente...

Talvez seja apenas a minha bolha, mas parece que as movimentações no sentido de resistir a Big Tech estão ficando cada vez mais fortes. Tomara que sim, acho que esse modelo de negócio já deu o que tinha que dar. A maneira como ficamos dependentes desses meios para nos organizar é assustador. Não sabemos mais encontrar comunidades, pessoas e arte sem intermédio do algoritmo, poucas pessoas entendem a tecnologia que dá forma ao nosso mundo, as vezes de maneira muito destrutiva. Chegamos nesse ponto muito em virtude da conveniência. É tudo muito fácil, muito rápido, tão sem atrito... e isso que corroeu a resistência e a dose saudável de ceticismo necessária quando encaramos qualquer empreitada sob o capitalismo. E aqui estamos. Uma vez vi um comentário no YouTube dizendo que toda essa conveniência ia acabar nos matando. Essa pessoa estava certa.

Quem sabe seja a hora de exercitar um músculo pós-web, se frustrar muito e desenvolver novas estratégias. Inclusive, quem sabe, tentar uma abordagem mais oldschool e reorganizar a vida tangenciando a internet, ao invés unicamente através dela. Como as chamadas telefônicas, podemos um dia olhar para trás e ver que nem precisamos tanto assim dessa tecnologia para nos conectar. Ela ainda está lá, tem sua função e usamos as vezes, mas virou essa terra de ninguém ocupada quase que exclusivamente de de bots, anúncios e golpes. Por isso, imagino que descentralizar a internet de nossas vidas, ou pelo menos a versão atual da internet, possa ser o futuro. Reaprender a existir longe dos olhos do grande irmão. Um pouco mais de uso consciente, pensando sempre em alternativas, e um pouco mais de senso crítico já vai ajudar bastante. O fedi, nosso amigo Jefferson, com certeza faz parte do futuro descentralizado.


Isso é tudo pessoal. Esse texto é um pensamento ainda em aberto, inspirado por ler muita coisa essa semana sobre estratégias que as pessoas estão tentando desenvolver para se sentir um pouco menos vendidas para a Meta, o X, Microsoft e companhia limitada. É a pergunta de um milhão de dinheiros, podemos superar a Big Tech?

Também li umas noticias bem interessantes sobre o tema, links abaixo.