Home Office devia ser um direito trabalhista

Nessa terça-feira, dia 11 de março, fui trabalhar no escritório, que fica a quase 30km de distância da minha residência, e tive uma surpresa desagradável logo que liguei meu notebook para começar a trabalhar. Lia-se no comunidado: “Retorno ao Presencial!” em letras garrafais. Meu estômago despencou. A comunicação se desenrola com as desculpas de sempre sobre por que precisamos voltar ao panóptico que chamamos de escritório: a cultura da empresa, a “sinergia” e toda essa baboseira. Me lembrei desse vídeo no Tiktok, de um cara reagindo a uma matéria das Forbes que lista as principais razões pelas quais as empresas optam pelo retorno ao presencial.

A empresa onde trabalho é considerada uma das melhores da região para se trabalhar. O salário é bom, tem muitos recursos para os funcionários (me recuso a usar o termo “colaboradores”) e também tem várias iniciativas de sustentabilidade e inclusão, além de incentivar a inovação e a tomada de decisões data driven. Eu acredito firmemente que a volta ao presencial é um golpe pesado em todos esses aspectos.

A começar pelos salários, a maioria de nós vai ter que desembolsar muito dinheiro para o combustível para ir para a planta durante a semana. Apesar de oferecer fretado e vale transporte, muitos moram muito longe e perdem um tempo considerável se optarem pelo ônibus. Uma jornada de trabalho que deveria ser de 8h diárias, vira 12h ou 14h considerando o tempo de deslocamento. Isso sem contar que a empresa é localizada em uma região de transito intenso, que com certeza vai ser ainda mais intenso com o aumento de pessoas tendo que passar por ali todos os dias.

Naturalmente, entramos no assunto da sustentabilidade. Janeiro de 2025 foi o janeiro mais quente da história e provavelmente será o janeiro mais fresco do resto de nossas vidas. O colapso climático é real, quer as pessoas acreditem nele ou não, o que nos obriga a perguntar: qual será a consequência dessa volta aos escritórios e seu inivitável aumento de emissões de gases de efeito estufa para um mundo que já está em colapso? Como uma empresa que força o presencial goela abaixo de seus funcionários ousa dizer que é sustentável?

Por fim, chegamos na inclusão. Apesar das iniciativas existentes, o lugar onde eu trabalho tem uma óbvia dificuldade para diversificar seu quadro de funcionários, principalmente no que diz respeito a PCDs. O home office era uma forma de ser mais inclusivo, ao pertir que pessoas com algum problema de locomoção não precisem se submeter ao desgaste diário de ir e voltar do trabalho todos os dias. O home office é, ainda, inclusivo para pessoas que tenham alguma neurodivergência que as torne sensíveis aos estímulos sensoriais do ambiente do escritório. Dúvido muito que esses grupos de pessoas vão se sentir mais motivadas e produtivas no presencial.

Chegamos por fim, no tal data driven. Segundo esse artigo, ser orientado por dados significa “tomar decisões com base em dados analíticos e quantificáveis, em vez de simples intuição”. Neste caso, vamos aos dados: estamos todos cansados de saber que o home office aumenta o bem-estar e a produtividade, que um funcionário bem descansado é um funcionário que trabalha melhor. Então por que estamos indo contra esses dados? A algumas semanas atrás, tivemos um evento da divisão para comemorar o alcance de metas e resultados positivos, então, por quê ao invés de bonificar os empregados, a empresa tira deles? Por que estamos sendo punidos?

Enfim, isso tudo para dizer que estou extremamente chateada e decepcionada. Não é novidade que nenhuma empress tem valores de fato, afinal, o único valor que importa é aquele na conta bancária. Ainda assim, não consigo deixar de ficar espantada com a forma como mentem para nós na cara dura, o tempo todo. Eles vão continuar dizendo o quanto são ecologicamente e socialmente responsáveis, que tomam decisões baseadas em fatos e não nos impulsos da gerência e vão dizer qualquer coisa que os faça parecer bons e justos, se isso der dinheiro, mas nós sabemos a verdade.